“Resgatar a memória cultural de uma região é a maneira mais respeitosa de reverenciar a história de seu povo”. Prof. Me. Yhulds Giovani Pereira Bueno.
Lendas locais são tesouros culturais que se entrelaçam com a realidade, criando inúmeras narrativas que ecoam através do tempo. Elas emergem das experiências compartilhadas, das tradições orais e das histórias baseadas em fatos reais que marcaram uma época, transmitidas de geração em geração produzindo uma estória que tem origem nos contos e mitos de uma região.
No Brasil, e não diferentemente na fronteira, temos uma riqueza de lendas que se enraízam, mesclando-se com nossa história e cultura diversificada. Tecendo uma narrativa atemporal cheia de mistérios, aqueles que as vivenciaram ou ouviram de alguém que passou por esta região, memórias adormecidas na lembrança dos fronteiriços, mas quando despertadas trazem várias recordações.
Por meio desta narrativa, recordamos uma destas lendas cercada de mistério de um personagem fronteiriço já está esquecido, mas que habitou por estas terras, empreitava trabalho nos ervais da região, conhecido por “Matias Tataty” nome que pode ter origem tupi-guarani (tata’y que significa fumaça de madeira grossa, dura que demora a queimar).
Matias Tataty era um homem rígido, de poucas palavras e bruto em seu trabalho nos ervais produzidos e cultivados nas fazendas ervateiras do passado desta fronteira, Matias era cheio de mistérios, mas muito respeitado e temido, pois muitos comentavam que ele possuía poderes sobrenaturais, acordos com espíritos e seres antigos que habitavam as matas, em troca ele teria os seus pedidos atendidos, se esta lenda era verdade ou não, quem descende dos antigos moradores e cresceu escutando as estórias sobre “Matias Tataty”, mencionava que ninguém se atrevia a duvidar, pois eram mistérios de outras épocas.
Arquivo: prof. Me. Yhulds Bueno. Fazenda Emboscada. Década de 1930. Imagem Carlos Morel.
Muitas eram as estórias que rodeavam a vida de Matias Tataty, um destes causos conta que: em época de colheita nos ervais nativos, na fronteira, eram carregadas centenas de sacos de erva-mate chamados de “raído”, sendo extremamente pesados, um trabalho braçal bruto que demandava tempo, isso ocorria do nascer do sol até o sol se pôr, nesses tempos não havia o luxo da luz elétrica na cidade, imagine como era a vida no campo e nas colônias distantes. No período de colheita nos ervais que Matias Tataty demostrava seu poder, realizando feitos que os mais céticos não se atreviam a contestar.
Arquivo: Prof. Me. Yhulds Bueno. Colheita de erva-mate, Fazenda Emboscada família Francisco Rodrigues década de 1930, Imagem Carlos Morel
Conta a lenda que após uma colheita abundante de erva-mate, imensos sacos cheios de folhas chamados de “raído” eram transportados por longas distâncias pelos trabalhadores, que em sua maioria de origem paraguaia ou indígena, estes carregavam os “raído” até os galpões para ficarem protegidos. Certo dia, um grande temporal surgiu na região fronteiriça, os ervateiros exaustos de tanto carregar em suas costas os imensos sacos de erva-mate para proteger da chuva, não conseguiriam terminar a tempo e poderiam perder grande parte da colheita, Matias Tataty observando o que poderia acontecer pediu para os ervateiros seguirem em frente, pois o restante da colheita ele protegeria. Os ervateiros assustados e nervosos, não esboçaram nenhuma resistência à ordem dada por Matias Tataty e seguiram em direção à sede da fazenda levando o que podiam para ser guardado no galpão, como o trabalho era puramente braçal, em certo ponto da caminhada as carretas de boi ajudavam no transporte, mesmo assim era árduo e lento.
Foto divulgação: FCMS-Federação da cultura de Mato Grosso do Sul, publicada na revista Cultura MS – Nº 03. Típico fazendeiro ervateiro do início do século XIX da região de fronteira bebendo tereré ao lado de “pé de erva” Tereré de Ponta Porã registrado com patrimônio imaterial em 2010. Fonte: http://www.overmundo.com.br/overblog/sabedoria-documentada.
Após a chegada dos ervateiros ao galpão, observaram que “Matias Tataty” chicoteava os sacos de erva-mate ao longo da estrada com um reio, “chicote tramado” feito de couro fino, e os mesmo seguiam rumo ao galpão, os ervateiros assustados com os clarões dos raios que cortavam o céu e escutando ao fundo os estalos do chicote de Matias Tataty, testemunharam que os “raído” de erva-mate seguiam em marcha e se amontoavam um a um dentro do velho galpão. Sempre cercado de mistérios, ninguém se atrevia a questionar “Matias Tataty” nem mesmo os próprios donos dos ervais.
Foto divulgação: Lugares de Memória dos Trabalhadores #36: Matte Larangeira, Laguna Carapã (MS) – Vitor Wagner Neto de Oliveira – Laboratório de Estudos de História dos Mundos do Trabalho. Fonte:
Das várias estórias sobre “Matias Tataty” uma em especial chamava atenção, tanto que nos dias de hoje seria algo, que somente os melhores ilusionistas conseguiriam realizar, segundo relatos das inúmeras estórias e lendas que cercam a vida de “Matias tataty” o bruxo dos ervais, que tinha o poder de transformar folhas de erva-mate em dinheiro, por meio de uma de suas muitas orações, conta que ele entregava uma bolsa com folhas de erva-mate, quando a pessoa abria só enxergava dinheiro e não as folhas. “Matias Tataty” tinha a força de podar um pé de erva-mate estalando seu chicote e fazendo com que todas as folhas de erva-mate se desprendessem do pé, animais das matas atendiam ao som dos chamados de “Matias Tataty” muitos afirmavam que era o próprio “Pai do Mato”. Diziam que ele carregava em sua “Bruaca uma espécie de bolsa” um livro antigo de folhas amareladas de orações de São Cipriano.
O mistério permanece até os dias de hoje na região de fronteira, pois “Matias Tataty” desapareceu misteriosamente, sem rumo conhecido, o mesmo evaporou como Tata’y uma fumaça, muitos dizem que ele ainda habita nas matas da região. Se você ver uma fumaça em um tronco de árvore é “Matias Tataty” que está por perto.
Estas estórias são causos que viram lenda, dentro do imaginário e cultura de cada região, são contos oriundos de outras épocas, em que a fé, religiosidade e as crenças nesses assuntos eram diferentes dos dias atuais.
Pesquisa: Prof. Me. Yhulds G. P. Bueno. 30 anos de atuação na docência da Rede Pública e Privada. Formado em Educação Física, Formação Pedagógica e Licenciatura em História. Mestre em Desenvolvimento Regional e de Sistemas Produtivos; Pós Graduado em Metodologia do Ensino de História e Geografia; Pós graduado: Docência em Biblioteconomia; Pós Graduado: Ensino de História. Membro associado do Rotary Club Ponta Porã Pedro Juan Caballero Guarani – Distrito 4470