Além dos barracos, existem casas de alvenaria com garagem, mercadinho, oficina mecânica, ruas com nome e até ligações regulares de energia elétrica
14/06/2018 12h – Jornal de Notícias
Uma das piores coisas que um homem, principalmente com família, pode sofrer na vida é não ter onde morar. E, no afã de oferecer abrigo a si próprio e aos seus, muitas vezes o ser humano ultrapassa algumas barreiras que ferem os direitos constituídos, enfim, a lei.
É o caso de muitas das mais de 100 famílias de brasileiros e paraguaios “sem-teto” que invadiram, no início de 2012, uma área pertencente à União na antiga explanada da ferroviária, entre o quartel do 4º Batalhão da Polícia Militar, a sede da Fundação de Cultura e Esportes de Ponta Porã (Funcespp) e o conjunto habitacional “Chê Roga Mi”.
Só que, depois de seis anos, muita coisa mudou. Os barracos improvisados que foram espalhados pelos cerca 1.000 metros ² da “Favelinha” como é conhecida, deram lugar a casas de alvenaria, com bom acabamento e até com garagem; pequenos barracos já se transformaram em “bolichos”, oficina mecânica, salão de cabeleireiro, algumas ruas já têm placas com nome e muitas das casas têm instalação regular de energia elétrica efetuada pela Energisa.
PERIGO
Entretanto, além das ligações legais, com padrão fiscalizado pela Energisa, há muitas “extensões” das redes de uma casa para outra. A empresa disse que não há “gatos” furtando energia da rede de abastecimento e que, enquanto as contas estiverem sendo pagas, o fornecimento será mantido. Se há “gambiarras”, extensões ou problemas na fiação, depois do padrão, a responsabilidade é do usuário. Ocorre que os fios que levam a corrente elétrica de um barraco para outro não são próprios para resistir ao sol e à chuva, podendo ressecar e se romper. Além disso, as instalações utilizam pedaços de paus e até árvores para estender a fiação.
Não são poucas as tragédias já ocorridas em áreas ocupadas por barracos e com instalações elétricas precárias por esse Brasil afora. E, quando ocorre um incêndio, na maioria dos casos atinge quase toda a favela, em função do material altamente inflamável e da proximidade entre um barraco e outro.
Já no caso da água, a maioria dos invasores fez poços de cacimba, retirando o precioso líquido com baldes ou com bombas de sucção. A Sanesul garante que não há furto de água naquela região. Existem sim redes com mangueira pretas que levam a água de uma casa para outra. Alguns cavaletes abastecem 5 ou 6 barracos. Mas, a exemplo da Energisa, a Sanesul vai manter tudo ligado enquanto as contas estiverem sendo pagas. As duas empresas revelaram que efetuam fiscalização constante naquela região da cidade, para evitar, localizar e desfazer eventuais furtos de água ou energia elétrica.
REINTEGRAÇÃO
O Ministério Público Federal (MPF) em Ponta Porã instaurou inquérito civil para investigar a ocupação da área, que pertence à União, ainda em 2012, mas, não há informação sobre que fim levou o processo.
Depois disso, o MPF requisitou à Polícia Federal abertura de inquérito policial para apuração de crimes de invasão de terras públicas e loteamento clandestino. Entre outras diligências, deveriam ter sido identificadas todas as pessoas que estariam efetivamente morando nos imóveis.
Também foram requisitadas informações ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e à empresa América Latina Logística (ALL) sobre a propriedade, posse e uso do imóvel e as providências adotadas em relação à ocupação. Pelo que se sabe, ninguém respondeu.
Alguns políticos locais deveriam ter sido chamados para prestar depoimento sobre os rumores de que eles teriam se apossado de terrenos que teriam sido imediatamente murados e fechados. Sobre isso também não houve avanço, pelo menos ninguém sabe de coisa alguma a respeito, parece que a papelada toda evaporou.
Tudo isso é muito bom para quem está morando na Favelinha. Muita gente achou que poderia se apropriar do terreno pela lei da usucapião, mas ela não tem efeito sobre áreas públicas. De qualquer forma, é difícil acreditar que, do jeito que a Favelinha está hoje, alguém, em sã consciência, determine a desocupação. O mais provável mesmo é que o local acabe sendo urbanizado e transformado num bairro como os outros.
(Edmondo Tazza – MTE/MS 1266)
Fotos: Edmondo Tazza