23/04/2014 09h50
A grande dama do rasqueado cantou amores, natureza, beleza e os costumes da terra pantaneira
Midiamax
Gravar um documentário que narre a vida de uma das maiores artistas que Mato Grosso do Sul já conheceu não é tarefa fácil. Ainda mais que a história de Delinha se funde com a própria história musical do Estado. A grande dama do rasqueado cantou amores, natureza, beleza e os costumes da terra pantaneira.
Trazer para o conhecimento dos fãs e também daqueles que só ouviram falar quem foi Delinha é o desafio que a cineasta Marinete Pinheiro, formada na Escola Internacional de Cinema e Televisão (EICTV) de Cuba, se propôs. Junto com Jerry Espindola, produtor do filme, eles já estão em gravação de “A Dama do Rasqueado”. “A ideia nasceu de uma necessidade. Queria fazer um documentário de uma mulher, e não poderia ser outra. Pensamos nela”, conta Pinheiro.
Marinete sabe a responsabilidade que assumiu, com a equipe, e já começou a juntar um pouco do que integrará o longa de 52 minutos, que está sendo produzido com recursos do FIC (Fundo de Incentivo à Cultura) – total de R$ 55 mil.
Em dezembro passado, ela aproveitou o circuito universitário da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e gravou em várias cidades com Delinha. Corumbá, Coxim, Ponta Porã e Maracaju foram algumas das cidades que receberam a grande dama e equipe do videodocumentário. “Gravamos com ela e aproveitamos para pegar alguns depoimentos”, conta Marinete, lembrando que são muitos os artistas que contam belas histórias com Delinha.
Rasqueado e Poesia
Um dos pontos fundamentais do filme, que será bem musical, revela, será explicar o que é esse tal rasqueado. O estilo mais arrastado, com forte influência do chamamé, consagrou Delinha. “É um gênero bem específico, tocado pelo Délio e pela Delinha”, lembra Pinheiro.
Fã da dupla, Marcelo Loureiro gravou depoimento e fala no documentário a diferença do que é o rasqueado.
As letras das músicas, consideradas verdadeiros poemas, por muitos, é outro assunto que rende conversa. Marinete conta que Paulo Simões é outro fã de Delinha e brinca não se perdoar por não ter sido ele o compositor de “Por onde andei”. “Ele diz no documentário que é a música mais linda de Mato Grosso do Sul, que é um verdadeiro blues, e até brinca que queria ele a ter composto”, conta.
Talento
Marinete conta no filme que a dupla foi a primeira de Mato Grosso do Sul a assinar contrato com uma gravadora. E a seleção não era fácil. “Antigamente as gravadoras tinham uma avaliação muito rigorosa do talento das pessoas. Hoje quem tem dinheiro paga uma gravadora e grava. Antes era preciso ser extraordinário”, diz.
E foi esse algo além que levou a dupla do interior para gravar em São Paulo. Apesar de o sucesso ter batido a porta e tudo parecer glamouroso, Delinha conta no documentário que tudo foi muito difícil, e eles acabaram voltando para Campo Grande.
O começo, o fim
Logo depois veio a crise no casamento e o fim da dupla, que ficou 20 anos separada. Até que após o segundo marido ter morrido, Delinha volta a cantar com Délio a pedido do público. “Ela conta que eles ensaiavam separados e só se falavam no palco. Mas todos queriam o casal de ‘onça’ juntos cantando”, relembra.
E assim eles voltaram a cantar até que Délio também faleceu. Hoje ela canta com o filho João Paulo e por onde passa, ainda causa frisson. Como uma estrela que nunca se apaga, o jeito delicado aliado a uma alma guerreira, de mulher forte, encanta, revela Marinete, que também já se rendeu aos encantos de Delinha.
Por onde Andei – Délio e Delinha
Tive medo da madrugada
depois de uma noitada
Bebendo todas pra esquecer
Meus passos eram incertos
Tudo era deserto
Na Rua do Padecer
Padecer que não doía
E já era um novo dia
Ao meu lar então voltei
Minha casa, minha rua, meus amigos
Me olharam como inimigo
A perguntar por onde andei
No lugar das luzes multicores
Senti os perfumes das flores
Fiz de tudo e nada fiz
Entrei no cassino e joguei
Se ganhei ou perdi eu não sei
Esta noite eu estava feliz
Se violão, bebida e serenata
E um belo luar de prata
São companhias pra reprovar
Alguns beijos perdidos
Alguns abraços esquecidos
Que então venham me condenar
Padecer que não doía
E já era um novo dia
Ao meu lar então voltei
Minha casa, minha Rua, meus amigos
Me olharam como inimigos