Anta símbolo de Campo Grande morre atropelada na BR-163

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Duro-de-Matar foi apelidado desta forma devido a sua história de luta.

Quem costuma frequentar o Parque dos Poderes, em Campo Grande, possivelmente já viu uma anta com caminhar manco, que por conta disso recebeu o apelido de “Duro-de-Matar”. Agora, porém, o animal não será mais vista, pois morreu atropelado na BR-163, conforme constatado por pesquisadoras da INCAB (Iniciativa Nacional para a Conservação da Anta Brasileira).

Duro-de-Matar foi apelidado desta forma devido a sua história de luta. O macho, que faria 11 anos em 2025, foi caçado quando tinha cerca de sete anos e quase perdeu uma de suas patas. Recuperada, a anta passou a viver nas áreas verdes da região norte de Campo Grande e era facilmente reconhecida por andar mancando, sequela de seu ferimento. 

O animal foi atropelado no final de janeiro, mas foi enterrado pela CCR MS Via logo em seguida. Nesta quarta-feira (19), a equipe da INCAB-IPÊ foi até o local em que ele foi enterrado para recuperar seu crânio. Por meio da arcada dentária foi possível confirmar que se tratava do Duro-de-Matar. 

Com um nome muito particular, Duro-de-Matar tem uma longa história de resistência. Em 2021,  fez sua primeira aparição, mas, infelizmente, foi devido a uma trágica ocorrência. O macho, na época com cerca de sete anos, foi capturado por um laço de caçador em uma fazenda próxima à cidade e teve uma de suas patas dianteiras parcialmente decepada.

Após ser encontrado, resgatado e levado para o Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS), recebeu os cuidados e tratamentos necessários e levou 90 dias para se recuperar.

Sua luta pela sobrevivência foi um grande feito, já que é extremamente complexo tratar animais silvestres de grande porte com ferimentos tão graves quanto o que ele apresentava. 

Fujão
Após contrariar as estatísticas e se recuperar da lesão, Duro-de-Matar decidiu explorar a cidade grande e fugiu do CRAS! Passou a viver pelas áreas verdes da cidade, particularmente no Parque dos Poderes e eventualmente no Parque das Nações Indígenas e imediações dos altos da Avenida Mato Grosso. 

Foi assim que seu caminho cruzou com a equipe da INCAB-IPÊ e moradores da Cidade Morena. Duro-de-Matar foi a primeira anta capturada, equipada com colar de GPS e monitorada pelo Projeto Antas Urbanas, conduzido pela INCAB-IPÊ em Campo Grande. 

Após a primeira captura, em 2022, a equipe do projeto tomou conhecimento de sua história de luta através dos profissionais do CRAS e o batizou como ‘Duro-de-Matar’ (menção ao filme de 1988 de mesmo nome). 

Desde então, ele foi capturado mais três vezes, sendo que a última ocorreu em dezembro de 2024, para a remoção do segundo colar de monitoramento que ele carregava. Duro-de-Matar era um símbolo para os moradores da cidade que o reconheciam por seu caminhar. 

Herdeiro
Antes de sua morte, o macho vinha sendo avistado frequentemente junto com uma fêmea com filhote e a população comentava sobre o relacionamento e a família que havia se formado. 

“Esse indivíduo tinha uma importância gigante como embaixador para a conservação da anta brasileira em todo o nosso país. Nossa equipe trabalha com essa espécie há quase 30 anos e por todo o país. Estamos presentes nos cinco biomas onde a anta ainda ocorre.

A anta é um animal associado pejorativamente com a falta de inteligência e embaixadores como o Duro-de-Matar são imprescindíveis” afirma Patrícia Medici, coordenadora da INCAB-IPÊ.

Duro-de-Matar morreu em uma colisão veicular na BR-163 próximo de um canteiro de obras para a construção do viaduto que está sendo construído pela Plaenge. 

Morte de 50 humanos
O atropelamento traz à tona o problema crônico das rodovias do Mato Grosso do Sul: as colisões veiculares com fauna. Um monitoramento de sete anos realizado pela INCAB-IPÊ, demonstrou que 100 antas são atropeladas anualmente nas rodovias do estado. 

Além do impacto óbvio para a biodiversidade, esse número representa ao menos 100 vítimas humanas envolvidas em colisões veiculares com um animal de grande porte. Uma anta pode chegar até 250-300 kg e uma colisão com esse animal é um acidente grave que pode ocasionar perdas humanas, materiais e financeiras. 

(Com assessoria do INCAB)

O levantamento da INCAB-IPÊ identificou que 50 pessoas já morreram nas rodovias do estado devido a colisões com antas, nos últimos 12 anos. Vias seguras para a fauna e para os usuários é um direito previsto em lei e cabe aos gestores dos empreendimentos aplicarem medidas mitigatórias efetivas. 

Os estudos científicos e especialistas em ecologia de estradas comprovam que as passagens de fauna, associadas com cercamento adequado da via, podem diminuir o número de colisões veiculares com fauna em até 80%.

 Enquanto a implementação de medidas mitigatórias efetivas não for feita, continuaremos perdendo biodiversidade e colocando em risco a vida dos usuários desses empreendimentos, além de ferir o direito de cada cidadão de ter acesso a vias seguras, ressalta Patrícia Médici

Fonte: Correiodoestado